Saiba mais sobre o PARQUE TECNOLÓGICO
A Implantação do Parque Científico e Tecnológico na Faixa de Fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia – PCT Alto Solimões é uma proposta com precedente já em execução. Possui uma base teórico-metodológica sobre o Mapeamento das Cadeias Produtivas da Fruticultura e Biodiversidade já em andamento, com ações previstas no TED 01/2020 MDR-UFAM. Este TED foi resultado do ‘Apoio à Implementação de Infraestrutura Complementar, Social e Produtiva na faixa de fronteira’, para viabilizar iniciativas posteriores ligadas as Rotas de Integração Nacional que trabalham as redes interligadas de arranjos produtivos locais (APLs).
A região amazônica possui uma agrobiodiversidade sabidamente rica. Na microrregião do Alto Solimões, bem como em outras localidades da Amazônia, comunidades e povos tradicionais residentes compartilham recursos genéticos desenvolvidos por meio de suas práticas na agricultura e extrativismo (animal e vegetal), o que garante a segurança alimentar destas comunidades e povos, além de promover a conservação das espécies vegetais por meio de sua dispersão e resgate das espécies cultivadas (NODA; NODA, 2003). Porém, há a necessidade de fortalecimento destas experiências de manejo, dos sistemas tradicionais de produção desenvolvidos aliando estas estratégias à pesquisa em desenvolvimento e transferência tecnológica, alavancagem e distribuição de resultados econômicos e a garantia de proteção deste conhecimento e dos direitos dos mais de 12 grupos étnicos indígenas da região.
A Microrregião do Alto Solimões apresenta características socioeconômicas favoráveis para esta relação. Apesar do Estado do Amazonas não figurar dentre as últimas posições dentre as Unidades da Federação, com um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) considerado alto (entre 0,700 – 0,799) somente a capital Manaus, dentre 62 municípios do Estado do Amazonas, possui essa classificação Alta. Todos os outros municípios possuem classificação de médio (0,600-0,699), baixo (0,500 – 0,599) e muito baixo (0,000 – 0,499). A Região do Alto Solimões concentra os piores índices regionais, sendo Tabatinga (0,616) o único dos oito municípios que se enquadra na classificação média. Com índice baixo estão Benjamin Constant (0,574), Amaturá (0,560), Tonantins (0,548), Fonte Boa (0,530), São Paulo de Olivença (0,521) e Jutaí (0,516) e outros dois municípios com IDH considerado muito baixo, Santo Antônio do Içá (0,490) e Atalaia do Norte (0,450), sendo este último município o pior índice do Estado e o terceiro pior do País (IPEA, 2019).
Garantir a alavancagem e distribuição de resultados econômicos na região se faz necessário. O princípio da “equidade” na economia nada mais é que prover condições de reprodução econômica e social para promover “eficiência”, ou seja, capacidade de geração de riquezas (MANKIW, 2005). Sendo assim, na ótica econômica, sempre é justificável investimentos em regiões com baixa condições competitividade, uma vez que a relação entre investimento e retorno em riquezas será positivo. A Microrregião do Alto Solimões possui uma dinâmica de produção, logística e de distribuição de resultados própria. Aliando a visão econômica e o baixo IDH-M supracitados, garantir condições para a geração e distribuição de resultados econômicos produzirá impactos na alavancagem das iniciativas endógenas como motores propulsores da ocupação e renda, amenizando o quadro já instalado da informalidade do trabalho no interior do Estado do Amazonas.
Considera-se a importância do desenvolvimento das cadeias dos produtos da agrobiodiversidade no Alto Solimões como fator determinante para atingir o desenvolvimento sustentável não só em nível microrregional, uma vez que na última década a Agricultura Familiar (AF) entra no foco das ações de desenvolvimento sustentável em nível mundial. As Nações Unidas designam o ano de 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar (do inglês International Year of Family Farming – IYFF), em convenção com a presença de 197 chefes de Estado. Três anos depois, é estabelecido que a AF passa a figurar como centro norteador de diretrizes de políticas agrícolas, ambientais e sociais nas agendas internacionais para um desenvolvimento mais igualitário e equilibrado, preceitos debatidos na agenda 2019-2028 chamada de Década da Agricultura Familiar das Nações Unidas (do inglês United Nations Decade of Family Farming - UNDFF) e institucionalizado no Plano Decenal da Agricultura Familiar 2019-2028 (FAO-IFAD, 2019). Este plano define a AF como instrumento fundamental das implementações dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nos territórios, uma vez que 78% das 169 metas dependem das ações exclusivamente ou principalmente realizadas em áreas rurais (BERDEGUE, 2019).
Considerando que as práticas da região são predominantemente voltadas a Agricultura Familiar e que o PIB agropecuário dos municípios do Alto Solimões representa nem 20% da riqueza dos municípios (SEPROR, 2020), identifica-se que a informalidade do trabalho e a produção voltada à subsistência abre margem para o desenvolvimento destas áreas rurais, com possibilidade de integração destas como fator de impulsionamento da representatividade da AF no PIB dos municípios. Com o fortalecimento da Agricultura Familiar e o apoio técnico para ações como a captação de crédito, impulsiona-se também a necessidade de formalização dos empreendimentos do terceiro setor, como associações e cooperativas, estas, organizações capazes de retirar do isolamento os pequenos produtores e garantir em curto e médio prazos a regularização e garantia de ocupação destes.
Neste sentido, compreender e valorizar a agrobiodiversidade no Alto Solimões e o saber milenarmente construído pelos povos indígenas da Região Amazônica é condição necessária para estabelecer um novo paradigma de desenvolvimento da Amazônia. Apesar de ser uma condição necessária, não é condição suficiente. Há a necessidade de fortalecer os sistemas integrados destes saberes tradicionais, integrando-os aos saberes tecnológicos, assim cria-se a condição suficiente para a conservação dos modos de vida tradicional como instrumento de afirmação da identidade coletiva e capacidade endógena de desenvolvimento local. Na divulgação dos processos sistemáticos de desenvolvimento em um novo paradigma que alia o saber tradicional e o científico, é possível a consolidação deste intercâmbio em negócios de impacto socioambiental que podem ser replicados por outras microrregiões da Amazônia. Negócios de impacto aqui são entendidos como “empreendimentos que tem a missão explicita de gerar impacto social e/ou ambiental ao mesmo tempo em que geram resultado financeiro positivo de forma sustentável” (ANPROTEC, 2020, s.p.).
A quebra da soberania nacional não se dá apenas nas fronteiras geopolíticas fisicamente delimitadas, mas também no processo de expropriação cultural e dos saberes locais, bem como na explotação dos recursos da agrobiodiversidade da região transfronteiriça. Neste sentido, sintetizar o intercâmbio entre saber tradicional e tecnológico em negócios de impacto social é uma forma de estabelecer diretrizes práticas enquanto prover a autonomia da sociedade local em desenvolver as estratégias adaptáveis às condições socioambientais da região. Ou seja, concatenar saberes, ciência, tecnologia e inovação em processos sistemáticos, como negócios de impacto social, garante que a sociedade local disponha de mecanismos para a própria afirmação de suas identidades coletivas, promoção da qualidade de vida e bem-estar com base nos princípios dos povos da região e, por conseguinte, garante que estes povos disponham de um rol de instrumentos para garantia da soberania nacional, na manutenção do território, da biodiversidade e da produção cultural/intelectual.